Não penso em nada. Não consigo lembrar de nada. Nem da noite passada. Quieta. Estiquei-me um pouco mais, encontrei um outro corpo. Não sei exatamente aonde nesse corpo toquei. Aparentemente não se incomodou. Não se mexeu. Eu queria que se mexesse, uma forma de impor a minha presença acabada de desadormecer. Fiquei quieta alguns instantes.
Segundos. Na transição entre o sono e a realidade, senti um toque. Armadilha. Aquele corpo sentira o meu toque. Armadilha. E dava respostas. Armadilha. E pedia respostas. Armadilha. E eu sem saber o que fazer. Redenção.
Me contorci um pouco e consegui me esquivar, mas loucamente à vontade de responder aos estímulos alheios. Me contive. Mente racional, mente co[m]edida. Isso durou mais alguns segundos, pois o corpo já se postava atrás do meu, imitando minha posição. Encaixando-se.
Embora tensa e cheia de tecidos entre aqueles dois seres quentes, havia um certo prazer meu naquilo. Uns cheiros típicos humanos do acordar. Uma não necessidade de abrir os olhos e a imensa vontade de mantê-los fechados.
I´ve got all my life to leave. I´ve got all my love to give.
Então. Essa luta de poderes mentais e instintivos certamente teria um fim, e, naquela manhã deslumbrante de chuva que caía por trás da janela; eu mesma teria que ser a bandeira. Seja a branca, seja a negra.
Voavam junto com lençóis e travesseiros, pudores, medos e medidas. O que restava agora eram apenas reverberações não escritas e não ouvidas, parimentos de estímulos anteriores.
As mãos se entreçavam pelos corpos como se houvessem olhos em cada ponta dos vinte dedos das mãos. E ouvidos nos dos pés. Cada círculo de pele era minunciosamente percorrido por instintos, a ponto de não permitir que nenhum território conhecido antes ou não pudesse passar despercebido.
Era a força do amor que deixava que cada gota de existência fosse se esvaindo… se esvaindo e depois fosse trazida de volta por saudades sem um destinatário. Um momento na vida de qualquer trapo humano, qualquer um que se configure cabeça-tronco-sexo-coração.
Lorena A.
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